“O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, afirmou ontem que é a favor da união civil de pessoas do mesmo sexo. Disse, porém, que o casamento é uma questão ligada à religião.
Acho que a questão do casamento propriamente dito está ligada às igrejas. A união em torno dos direitos civis já existe, inclusive, na prática, no Judiciário. Eu sou a favor do efeito do direito. Outra coisa é o casamento, que tem o componente religioso. Cabe à igreja decidir sua posição’, afirmou. (…)
Anteontem, Dilma disse que vai estudar a divulgação de uma carta se comprometendo a não mexer na legislação sobre aborto e outros temas considerados tabus para religiosos.Ela disse que considera o casamento entre homossexuais questão de igreja, mas também se manifestou a favor da união civil entre gays.
As posições religiosas sobre o aborto e o casamento gay têm pautado o debate eleitoral e foram consideradas um dos motivos que levaram a disputa para o segundo turno”.
Do ponto de vista jurídico, ambos estão errados. O casamento não está vinculado à igreja: ele é uma cerimônia civil. É o que diz o artigo 1512 de nosso Código Civil: “o casamento é civil e gratuita a sua celebração”. É apenas por exceção que nossa lei confere qualquer validade ao casamento religioso. É o que diz o artigos 1515: “o casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração”. Reparem que a lei diz que o casamento religioso só é válido se ele seguir os requisitos do casamento civil. Sem atender aqueles requisitos, ele não pode ser registrado.
E mais: as pessoas têm 90 dias para registrar o casamento religioso e, vale repetir, o registro só será válido se tiverem preenchido todos os requisitos para um casamento civil. É o que diz o artigo 1516: “o registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento civil” e “o registro civil do casamento religioso deverá ser promovido dentro de noventa dias de sua realização, mediante comunicação do celebrante ao ofício competente, ou por iniciativa de qualquer interessado, desde que haja sido homologada previamente a habilitação regulada neste Código”. Se não cumprirem esse prazo de 90 dias, terão de refazer todo o processo de habilitação para o casamento novamente, dessa vez junto ao cartório.
Por fim, e talvez a maior evidência de que, para as leis brasileiras, o casamento é uma questão jurídica-civil, e não religiosa, é que se alguém casar no serviço religioso e, antes de validar esse casamento civilmente no cartório, vier a casar-se com outra pessoa no civil, o segundo casamento (o civil) será válido, e o primeiro (o religioso) será nulo (ou seja, é como se nunca tivesse existido aos olhos da lei). É o que está no último parágrafo do mesmo artigo 1516: “será nulo o registro civil do casamento religioso se, antes dele, qualquer dos consorciados houver contraído com outrem casamento civil".
No Brasil, não existe o casamento (ou união estável) entre pessoas do mesmo sexo porque não existe tal previsão legal. Ainda que as religiões se oponham, se a lei mudar, haverá casamento (ou união estável) entre pessoas do mesmo sexo.